28 de setembro de 2016

Na minha porta não!

                Tudo começou com uma brincadeira. Na verdade a conversa teve início por causa de uma música “de viado” - I Will Survive – que tocava na vitrola da virada de ano. É um papo antigo, mas sempre atual. Toda forma de preconceito e discriminação carregam junto um porém que justifica as falas, tira o sujeito da responsabilidade do que diz e, por tabela, reforça nitidamente um preconceito em forma de aceitação. “Na minha porta não!” Dizia ele enquanto explicava sobre o excesso de viadagem que presenciou em uma ótica. A pessoa pode fazer o que quiser, não tenho nada com isso, mas... “Não precisa se abraçar em público”, “Na minha família não tem isso”, “Porque todo mundo tem que saber?”, “De mãos dadas é demais!”. E por aí segue a sequência de absurdos sobre a forma de perceber, vejam bem, as expressões DE CARINHO, entre duas pessoas do mesmo sexo. Não estamos falando de sexo explicito ou de manifestações públicas cuja intenção seja de fato agredir, mas da expressão de afeto entre duas pessoas do mesmo sexo que se amam e que, como todos, querem ter o mínimo direito de demonstrar esse amor. Ah o amor... “essa palavra de luxo”, mas que, quando aplicada ao não normativo, perde todo o sentido. Não era para ser algo adorável? Multiplicado entre as pessoas? Que gera bem estar e consequentemente mais amor entre as pessoas? Não seria o amor o caminho para a paz e a solidariedade que tanto desejamos? Puro engano. O amor só será aceito quando estiver dentro das normas. Dentro do que se estabeleceu sobre o que é certo, dentro dos padrões daqueles que muito provavelmente, não sabem amar. Não na essência, não na sua incondicionalidade, não no amor que se espalha e gera menos rancor e mal estar entre as pessoas.
                É certo que vivemos um momento de transformações e, justamente por esse motivo, posso escrever sobre esse assunto agora. Mas, apesar disso, ainda que todos nós tenhamos o desejo de viver o amor, o grande amor, esperamos que ele tenha forma, rosto, sexo adequado e tantas outras condições para ser aceito. Por sorte, alguns estão caminhando na contramão desse processo, ainda bem! E são essas pessoas que ajudam a tornar a vida de quem vive seus amores inadequados mais alegres, mais leves. Isso para mim é amor. O amor de quem consegue se colocar no lugar dessas pessoas, que consegue ir além da convenção e que se disponibiliza a estender a mão na direção do afeto e da construção. E as coisas triviais como convites para festas onde o casal está incluso, por exemplo, passam a ter um valor incrível. Por isso, o cuidado com o outro é sempre uma forma de carinho e compreensão. Quando “Não temos nada com isso” temos disponíveis duas opções: de fato não nos envolvermos, mas de forma sincera deixar que cada um tome conta da sua vida, já que não estamos buscando promover a homossexualidade, mas apenas viver esse amor como outro qualquer; ou passarmos a enxergar as causas sociais como coletivas e envolvermos nas discussões, na busca pelo conhecimento e na promoção da efetiva igualdade de direitos. 
Enquanto o amor precisar ser escondido atrás da porta ele falhará...