10 de outubro de 2018

Lute como uma mulher, não fraqueje como certos homens

Não é coincidência, mas talvez esse tema nunca estivesse tão evidente como nos últimos meses. Não é também uma novidade que sou mulher (talvez parecesse e não fosse...), mas certamente outras tantas coisas a meu respeito são da minha construção íntima e pessoal que hoje, por uma necessidade de expressar alguns pensamentos, senti vontade de compartilhar.

Fui uma criança extremamente tímida. Tanto que costumo dizer que eu era mesmo "envergonhada", que considero muito mais do que tímida. Cresci num ambiente familiar com muitas regras e princípios morais bem definidos, estudei em boas escolas (para os que nunca me leram sou filha de mãe professora e fui bolsista durante toda a vida escolar), aprendi que uma mocinha não fica de pernas abertas, deve falar baixo e não ri à toa. Criança não se metia em "assunto de adulto" e uma menina, especialmente uma menina, deveria se guardar para um rapaz que fosse sempre melhor do que ela e, entenda melhor do que ela como alguém que tivesse mais condição financeira. Eu não entendia nada disso e durante muitos anos da minha infância e até mesmo o início da adolescência eu queria brincar, me divertir em mundos criados do meu jeito, viver as minhas fantasias sem compromissos. Eu gostava da escola, talvez não pelos motivos certos, e fui uma aluna responsável. Fui criada por mulheres, e tive a oportunidade de conviver com quatro gerações delas ao mesmo tempo: minha bisavó, minha avó, minha mãe e minha irmã e primas. Delas, eu era realmente a mais quieta, menos expressiva, menos interessante ou pelo menos era assim que eu me sentia e escutava displicente o que aquelas pessoas adultas eventualmente sussurravam a meu respeito: "Ela é muito abestalhada", "Essa menina não faz nada sozinha" e coisas do tipo. Mesmo sendo a mais velha dessa quarta geração, sempre fui considerada aquela que demoraria mais para me desenvolver e o ar das palavras saídas das bocas das pessoas adultas era como se não houvesse muita expectativa sobre mim. E realmente não havia. Quando me percebi eu já estava diferente. Havia crescido, mesmo que ainda gostasse de coisas que eram consideradas de criança. Eu não tinha retardo, apesar de parecer por essas falas. Eu simplesmente não conseguia encontrar meu lugar nesse mundo tão cheio de regras e de certezas, principalmente a meu respeito. Não havia diálogo sobre nada. Minha vida foi sempre a minha vida durante toda a minha adolescência e início da idade adulta, compartilhada apenas com poucas amizades que fiz ao longo dela. Eu olhava para o mundo fora de casa e via pessoas tão diferentes de mim... Na rua, na escola, no cinema, na TV... E desejava ser um pouquinho de cada uma delas em suas qualidades que eu não conseguia ter. E eu desejei... desejei até que disse para mim mesma: Você vai ser tudo que quiser! Eu acho que ainda não acreditava nisso, mas eu disse e estabeleci metas. Metas pessoais e tão íntimas, tão íntimas que eu nunca compartilhei abertamente. Não me dei tempo algum, afinal era um projeto meu e eu não precisaria me cobrar caso não conseguisse. E assim aconteceu. Eu fui aos poucos modificando aquilo que em mim me incomodava e também aos poucos me distanciando dos olhares de fora que me julgaram tantas vezes. Esses eu passei a usar como referência em relação ao quanto eu tinha avançado nas minhas mudanças. Aos poucos me tornei menos tímida, o suficiente para me sentir bem e para não perder oportunidades. Fui entendendo sobre a vida, me abrindo para experiências, descobrindo a vastidão de possibilidades para ser quem eu gostaria de ser e conseguir o que eu gostaria de conseguir. Finalmente, um dia qualquer, me percebi mulher. Me percebi convicta de que a partir dali eu conseguiria tudo que eu um dia desejei, tudo que eu um dia achei lindo em outras pessoas, tudo que eu enfim merecia. Convicta de que era possível eu me vi conseguindo, não sem percalços, não se incertezas, mas eu sentia que os passos estavam me levando para onde eu gostaria de chegar. E a cada chegada, eu criava novas metas. Me tornei Psicóloga, Mestre, Doutora... depois professora de Universidade Pública, esposa e mãe. Hoje eu vivo meus sonhos e sonho todos os dias através da minha realidade. Aprendi que ser mulher é acima de tudo estar presente na sua própria vida e que desse lugar eu posso viver e vencer todos os desafios que surgirem no meu caminho. Eu não queimei sutiã, não segurei cartazes, nem comandei revoluções. Mas acompanho as tarefas, desempenho e dificuldades do meu filho, preparo seu café da manhã e o lanche da escola, acolho se chora por dor ou pesadelo, e brigo ou coloco de castigo se algo estiver muito errado, cuido da casa, das contas, brinco de Avengers, preparo almoço, coloco a mesa, resolvo problemas, trabalho (muito!), me canso, choro, tenho conflitos, sorrio, abraço, digo que amo e me aborreço, durmo sozinha, durmo abraçada, viajo de madrugada e nem sempre descanso, me preocupo, planejo, sinto saudade e me acostumo. Mas o melhor de tudo isso é que, hoje essa jornada é dividida. E eu tenho muito orgulho de dividir a minha vida e todas essas tarefas do dia a dia com uma mulher. Uma mulher forte, sensível e tão companheira que é difícil explicar por ser raro de encontrar. Somos mulheres de luta, porque todos os dias precisamos lidar com essas e tantas adversidades juntas, somos  mulheres de luta, simplesmente porque somos mulheres e essa é a nossa vida diária. Não abandonamos nossas missões nem vivemos das aparências que muitas vezes vemos no mundo vazio de ALGUNS homens (vale o destaque). Especialmente aqueles que dizem muito e fazem pouco. Que querem direitos sem cumprir deveres. Que só enxergam o mundo sob a sua ótica egoísta e limitada. Com essas pessoas não há diálogo porque o outro não existe. Com essas pessoas não há troca porque não existe verdadeira relação. Por isso é importante lembrar que quando as responsabilidades recaem nos ombros de mulheres como nós, nos tornamos mais fortes e enfrentamos ao invés de fugir como muitos homens e "pais de família" comumente fazem. Àqueles que estão do outro lado, que assumem suas responsabilidade e unem seus esforços com essas mulheres, nossa imensa admiração e respeito.

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